quarta-feira, abril 24, 2002

Sinto hoje em mim todos os momentos de minha vida que já se passaram...
Ou se perderam...
Sinto a dor da perda. Sinto o extase do amor.
Sinto a felicidade que poderia ter sido.
Sinto a tristeza que quase me matou.

Ah, por que deve minha alma ser como a pedra,
Que talhada em sentimento prossegue perene...
Quisera que a arte feita em meu peito,
Como um castelo de areia, desmoronasse,
Nada deixando, efêmera na beleza,
tornada novamente em pó...
Nenhum saudade deixando após a onda...

Mas não, fui brindado com um coração de pedra...
duro de moldar, impossível de tornar novamente
à forma original....
evocando sempre lembranças do que foi,
do que poderia ter sido...
do que jamais será...

Carlos anda pela rua distraído, meio que assobiando, meio que murmurando “chega de saudade”. Na verdade, a música está entranhada na sua cabeça. Ele acha que deveria estar sentindo saudade de algo ou de alguém, embora não esteja certo de que ou quem....
Passa distraído, não percebendo a beleza da arquitetura de um prédio do centro do Rio de Janeiro à sua direita, ignorando completamente a existência de diversos meninos de rua que o olham passar, meio que esperando uma esmola, meio que pensando em uma maneira de levar a sua carteira...
Carlos não percebe que Maria, morena, bonita, de alguma forma se encanta com o seu andar, com o seu jeito distraído, ou sabe-se lá com o que. Aí está mais uma das histórias de amor que nunca ocorreram...
Estivesse Carlos menos distraído, menos mergulhado em si mesmo, perceberia que Maria não era, afinal, nada de se jogar fora... Além de bonita, era uma pessoa bem interessante...
A culpa toda disso pode ser imputada a Tom Jobim... Não tivesse ele composto “Chega de Saudade”, talvez naquele dia Carlos prestasse mais um pouco de atenção a sua volta. Talvez percebesse Maria, seus olhos curiosos seguindo sua passagem... Talvez parasse e pedisse seu telefone... talvez a chamasse para tomar um chope, ou talvez não....
Talvez Carlos ignorasse Maria e dirigisse seu olhar para Carmem, que andava do lado da primeira, e, também absorta em alguma música que tocava em sua cabeça, sequer percebia que Carlos passava próximo a elas...
Talvez Carlos se tomasse de amores pro Maria, talvez fosse rejeitado e talvez, desesperado, se matasse...
Mas, na verdade, nada disso aconteceu... Carlos seguiu andando, meio que assobiando, meio que murmurando... Maria seguiu, ignorada, seu caminho ao lado de Carmem, que não pensava em nada, senão em qual seria a letra daquela música cuja melodia não saía de sua cabeça.

Putz... parece uma daquelas épocas...
Não sei o que vem acontecendo comigo, parece que resolvi revisitar todos os meus antigos relacionamentos, à la "Alta Fidelidade" (embora tenha que dizer que não tive o menor impulso de procurar as minhas ex...).
Parece que todos os fantasmas do passado resolveram assombrar a minha casa. Alguns eu mesmo chamei, outros vieram por sua livre vontade, destino ou sorte (if chance you call it).
Por falar em Alta Fidelidade, ontem acabei de ler o livro. É impressionante a identificação com uma série de situações lá descritas. Não que eu tenha me identificado demais com o personagem. Os problemas dele parecem de outra natureza. Seus grandes traumas são os foras que leva. Isso não acontece comigo. Normalmente, eu é quem saio fora. Só que fiquei pensando, às vezes parece que é mais fácil quando você leva o pé-na-bunda. Tira completamente a sua responsabilidade pelo fato, vc se desespera, chora, fica se sentindo o mais injustiçado de todos os seres humanos, mas se conforma pois, afinal, é algo além da sua capacidade de decisão. Ela simplesmente não quer mais ficar com você e pronto.
Acho que é sempre mais difícil quando você é quem termina, qualquer que seja o motivo. O peso da decisão está unicamente sobre seus ombros. Vc decidiu. Certa ou errada, a escolha foi sua, e vc tem a consciência de que qualquer dor ou alegria que daí resulte somente pode ser imputada a sua pessoa. Creio que aí está o problema. Não sou o tipo de pessoa que está, na maioria das vezes (se é que em alguma) convicto do que quer. Todas as possibilidades me parecem viáveis, de um modo ou de outro, daí o peso da decisão de fechar uma porta se faz sentir com toda a sua dureza.
Isso é terrível.... É sempre melhor poder acreditar que a sua felicidade ou infelicidade é estabelecida de acordo com um desígnio divino, que você não é responsável por nada do que te acontece... Simplesmente não era pra isso acontecer com vc. Pronto. Vc está absolvido. Nenhuma culpa por qualquer fracasso resta para vc. É mais fácil dormir com isso...
Não é o que acontece quando vc tem que se confrontar com o resultado de suas escolhas... Acho que por isso eu, enquanto posso, deixo de tomar qualquer decisão drástica, tentando manter em aberto todas as possibilidades, embora não usufrua de nenhuma... Isso, na verdade, é uma merda....
Não sei porque estou nesse clima... Talvez seja por que nos últimos dias, vários de meus antigos casos me procuraram novamente... Alguns deles não têm, em verdade, nenhuma viabilidade (ou talvez tenham - isso é o que me fode)... Outros foram histórias nas quais eu via a possibilidade de uma continuação e, de uma maneira ou de outra, acabei fodendo com tudo.... Parece impossível me livrar dos fantasmas, me livrar dos "e se eu tivesse continuado com ela"... isso é horrível...
Uma das minhas ex (na verdade, A minha EX, pois sempre que me refiro a uma ex, penso nela) me disse certa vez que eu nunca decidia nada... ficava sempre adiando a decisão até que o tempo decidia por mim... "Não sei se vamos sair hoje... Não sei se eu devo... Não sei se eu quero..." daí já era meia noite e não dava mais para sair mesmo... é inegável que ela tinha razão... Na época me parecia interessante essa sensação de ser levado ao sabor do vento... De esperar o que o "destino" reservava para mim... era confortável...
Hoje, já não tenho tanta certeza... Como diz a música "Time", every year is getting shorter/ never seem to find the time/ plans that either come to naught/ or a half page of scribbled lines...
A sensação que tenho é a de que meu tempo está passando, chegando ao final, há menos areia no topo da ampulheta, enquanto isso a da base parece crescer de uma maneira assustadora....
Porra, que merda de devaneio autocomiserativo é este... Será que estou assim porque passei parte da tarde de hoje batendo um animado papo com o atual de minha última ex, com a qual eu terminei por achar que não estava legal, que faltava paixão, que não tinha nada a ver comigo, sendo que, nas últimas semanas, passei a questionar se tomei a decisão acertada... Afinal, era uma menina legal, e eu gostava dela (embora não loucamente)...
Ah! merda de vida!
É, na falta de um analista, eu uso uma página na internet para tentar me entender...